FC19#7 🚑Alerta vermelho para casas de repouso
Excesso de mortes em asilos, a novela da hidroxicloroquina e apagão de dados são nossos destaques.
( 👁️︠ ͜ʖ ︡👁️)𝘽𝙤𝙢 𝙙𝙞𝙖❗
Eu sou Cláudio Cordovil e hoje é dia 8 de junho de 2020 .
Ferramentas Covid-19 🛠 busca contribuir para a qualificação da cobertura jornalística nacional sobre a pandemia.
⌚Hoje temos uma contagem de 2.131 palavras, ou uma leitura de 9’30’’.
👵Como está a situação nas casas de repouso?
Há algo de estranho na ausência de uma cobertura mais intensiva acerca da situação da Covid-19 nas Instituições de Longa Permanência para Idosos (ILPI) no Brasil (também conhecidas como asilos ou casas de repouso).
Nos EUA e na Espanha, numa rápida varredura que fizemos na semana passada, o assunto do excesso de mortalidade nestas instituições tem despertado interesse.
Segundo o The Washington Post, relatórios do governo americano dão conta de que mais de 25 mil idosos morreram por Covid-19 nestas instituições, e 60 mil teriam sido infectados com o coronavirus nos últimos meses. A dimensão da tragédia por lá pode ser ainda maior, visto que somente cerca de 80% das instituições desta natureza nos EUA informam seus dados ao governo federal. Tais notificações começaram a ser obrigatórias somente a partir do início de maio.
Sim, sabemos que os idosos são uma população de altíssimo risco para esta pandemia. Mas a Vox Care resolveu ouvir especialistas em saúde pública acerca destes números. Eles foram unânimes em assegurar que isto não explicaria, por si só, a alta mortalidade nestes espaços. Outros fatores poderiam estar em jogo. Eles enumeram alguns.
Na Espanha, até terça-feira passada (2/6), contabilizavam-se, nestas instituições, pouco mais de 6 mil idosos mortos pela Covid-19 entre casos confirmados e suspeitos, segundo documento obtido por El País. O jornal espanhol também dá conta do vazamento de um protocolo do Ministério da Saúde para 22 hospitais em Madri, visando ‘escolher’ quais residentes idosos admitir em unidades de saúde.
Tenta-se, desta forma discutível, evitar o colapso do atendimento hospitalar. O documento também recomenda excluir do atendimento um dos grupos mais numerosos: os mais velhos com grau de dependência 3, ou seja, aqueles que precisam de ajuda várias vezes ao dia ou continuadamente.
Também sugere não atender pessoas com deficiência internadas em residências especiais. Deste terça-feira da semana passada, acumulam-se relatos na imprensa espanhola de cadáveres de idosos que não estavam sendo removidos de casas de repouso e sobre ambulâncias que não prestavam socorro.
E no Brasil? Qual a situação global das casas de repouso e assemelhadas, com relação a óbitos por Covid-19? Tais óbitos seriam produto do descaso e/ou da história natural da doença em um grupo de risco?
Pouco se sabe a respeito. O assunto foi de algum modo ventilado na mídia nacional, há algum tempo, por conta das mortes suspeitas ocorridas na rede hospitalar Sancta Maggiore, vinculada ao plano de saúde Prevent Senior. Elas motivaram duas investigações do Ministério Público do Estado de São Paulo, até este momento.
Até meados de abril, pelo menos 163 pacientes morreram de Covid-19, nos hospitais Sancta Maggiore. Não houve mais divulgação dos números de óbitos nas unidades.
Fora isso, o que se observa são matérias esporádicas, apontando a situação aqui e ali.
A meu ver, o caso mereceria uma reportagem investigativa. 🕵
As ILPI são reguladas pela Anvisa (RDC 283/2005) e fiscalizadas pelas Vigilâncias Sanitárias municipais e estaduais.
Recentemente, a ANVISA fez publicar a Nota Técnica 05/2020 que fornece orientações para a prevenção e o controle de infecções pelo novo coronavírus. A Secretaria Municipal da Saúde de São Paulo informou que uma inspeção da Vigilância Epidemiológica no Hospital Sancta Maggiore (19/3) constatou a existência de casos suspeitos de coronavirus não-notificados, incluindo óbitos por Covid-19. Pode se imaginar que esta seja a ponta de um iceberg ainda pouco investigado no País.
O fato é que o Brasil não goza de uma grande tradição de respeito aos direitos humanos dos idosos em ILPI, mesmo antes da pandemia. Estudo qualitativo conduzido por Ednilsa Ramos de Souza (ENSP/Fiocruz) e cols., e publicado em julho de 2019, já revelara que:
“A violência é um grande obstáculo, que atua na contramão do cuidado preconizado. Ela manifesta-se de diferentes modos na realidade institucional: sob a forma de negligência e abandono antes da institucionalização, mas também no interior das ILPI; nos preconceitos contra idosos; na visão negativa da velhice; na infantilização e despersonalização daqueles que acolhem; e no contexto macropolítico, pela ausência ou não cumprimento das ações previstas nas políticas públicas de atenção ao idoso ou na falta de legislações que atendam às suas necessidades”.
📈Apagão de dados e transparência pública
O Ministério da Saúde apagou de sua plataforma oficial os números consolidados que revelavam o alcance da pandemia no Brasil. Depois de ficar horas fora do ar na sexta-feira (5/6), o site oficial foi republicado neste sábado (6/6), mas somente com notificações registradas nas últimas 24 horas.
De lá desapareceram o número total de pessoas infectadas pelo vírus Sars-Cov-2 desde o início da pandemia e o acumulado de óbitos. Também foram apagadas do site as tabelas que mostravam a curva de evolução da doença, desde que o Brasil registrou seu primeiro caso, no final de fevereiro, assim como os gráficos sobre infecções e mortes por Estado.
Mais cedo, na mesma sexta-feira (5/6), manobras do governo para ocultar dados já haviam sido realizadas, com o atraso na divulgação dos boletins epidemiológicos, visando impedir que tais dados fossem divulgados em telejornais em horário nobre. A decisão pode comprometer ainda mais o combate à pandemia, já que os países mais bem-sucedidos na tarefa têm sido aqueles que reúnem, empregam e disponibilizam dados atualizados e precisos. É o caso de Singapura, França, Coréia do Sul e Itália.
O Legislativo já se movimenta. Tramita na casa o PL 2.151/2020 da deputada Tabata Amaral (PDT-SP) e do deputado Felipe Rigoni (PSB-ES). Uma emenda do deputado Alexandre Padilha (PT-SP) determinou ainda a inclusão da nacionalidade, a fim de tornar visível o impacto da doença entre imigrantes e refugiados. Ontem (7/6), o Conselho Nacional dos Secretários de Saúde (Conass) inaugurou um portal "paralelo" para divulgar dados da pandemia no país. Um pouco mais tarde, novos problemas com os dados divulgados pelo Ministério da Saúde.
💊A novela da cloroquina tem novos capítulos
Na quarta-feira passada (3/6), a imprensa noticiou que cientistas da Universidade de Oxford publicaram artigo na New England Journal of Medicine (NEJM), informando que não teriam encontrado benefícios da hidroxicloroquina (HCQ) na prevenção ou tratamento da Covid-19.
Estes cientistas, que também lideram os Ensaios Recovery, informaram que, por conta destes resultados, iriam suspender imediatamente o braço da pesquisa envolvendo 1,5 mil pessoas que iriam receber a HCQ. Os ensaios Recovery são um conjunto de testes feitos com mais de 11 mil pacientes internados por Covid-19 no Reino Unido.
Na quinta-feira (4/6), em entrevista coletiva, especialistas da Organização Mundial de Saúde (OMS) comentaram a decisão dos pesquisadores de Oxford, informando, contudo, que prosseguiriam com os estudos sobre a substância. Na véspera, os estudos da OMS com HCQ haviam sido retomados, depois de uma suspensão temporária.
Apesar de a pesquisa de Oxford ter sido alardeada pela grande imprensa como um estudo “rigoroso”, a mesma NEJM apressou-se em mostrar reservas a seu respeito. Afirmou em editorial que o mesmo era “mais provocativo que definitivo”. E finalizou dizendo que, diante dos resultados inconclusivos do estudo publicado, os potenciais benefícios da HCQ (e danos) ainda precisariam ser determinados.
Assim, as incertezas sobre a eficácia ou não da HCQ na prevenção da doença ainda persistem.
Mas o grand finale da série semanal de episódios da novela da HCQ ainda estava por vir.
Naquele que, até o momento, se configura como o maior escândalo acadêmico da era Covid-19, The Lancet e The New England Journal of Medicine (NEJM) anunciaram (4/6) que estavam retirando de suas publicações dois artigos de grande repercussão na imprensa.
Isto depois de a empresa Surgisphere, que participara de ambos, ter se recusado a disponibilizar os dados brutos que subsidiaram as conclusões dos artigos. Os dados seriam usados em uma auditoria independente, após questionamentos suscitados pelos estudos.
O artigo da Lancet, agora retirado da publicação, tinha tido repercussão mundial, tendo sido também trombeteado 📯 pela mídia como ‘o tal’. A informação nele contida (de que a cloroquina e a HCQ podiam ter graves efeitos) levara a OMS e outras entidades a suspender, temporariamente, estudos a seu respeito (volte ao início desta matéria).
Se, anteriormente, este artigo da Lancet havia soado como ‘bala de prata’ estatística contra a cloroquina e a HCQ, agora revelava-se não ter passado de um tiro na água.🔫 A montanha pariu um rato.
Resumindo : ainda é cedo para saber a verdade sobre a cloroquina e a HCQ. Aguardemos resultados mais conclusivos.
Na semana retrasada, tratamos também da HCQ por aqui (rolar a página depois de clicar no link).
Rápidas
⚡TURBINANDO A SUA APURAÇÃO - A IJNET-Rede de Jornalistas Internacionais publicou um artigo interessante sobre a ética a ser observada na cobertura da pandemia. São dicas sobre como dar notícias sobre mortes, preservação da confidencialidade das fontes, verificação de dados e como cobrir discursos de ódio. Também é do IJNET material relevante sobre como fazer perguntas difíceis em entrevistas acerca da COVID-19. Finalizando este bloco de dicas, sugerimos que você confira seu material sobre como cobrir assuntos de biodiversidade durante e após a pandemia. Boa leitura, especialmente porque na sexta-feira passada (5/6) celebramos o Dia Mundial do Meio Ambiente, esse grande esquecido.
⚡TRAÇO EM COMUM - Responda rápido: o que há em comum entre os países com mais mortes pela pandemia? De fato, Brasil, Rússia, Estados Unidos e Grã-Bretanha têm um traço em comum: são governados por líderes populistas conservadores do sexo masculino que se dizem anti-elite e anti-establishment. O New York Times analisou o fenômeno.
⚡TOME CIÊNCIA
Em meio a tantas incertezas, alguns fatos nos permitem melhor conhecer o coronavirus, e assim tomar decisões pessoais e coletivas mais acertadas no seu enfrentamento. Selecionamos alguns deles:
📰O El Diario publicou uma interessante matéria que atualiza os cuidados que devemos tomar, na liberação gradual e conscienciosa das restrições do distanciamento social. O mundo talvez jamais volte a ser o mesmo. Portanto, é necessária uma nova etiqueta de convivência social visando a redução de riscos.
📰O New York Times abriu espaço para os autores de um artigo científico (ainda em pre-print) que tem uma tese, no mínimo, interessante: se você quer conter a pandemia com alguma inteligência, concentre-se nos eventos superpropagadores do virus. Os epidemiologistas Dillon C. Adam and Benjamin J. Cowling chegaram a uma conclusão interessante: Vinte por cento dos casos são responsáveis por 80% dos contágios! No artigo, os autores recomendam que as autoridades de saúde pública se concentrem no rastreamento rápido e na quarentena de contatos, juntamente com o distanciamento social, para evitar eventos de grande disseminação em ambientes sociais de alto risco. E alertam para o grande vilão no contágio: as grandes aglomerações em locais fechados.
📰Mistério: Por que o coronavirus provoca só sintomas discretos em certas pessoas e severamente adoece outras? Parte da resposta, você já sabe, tem a ver com a idade e com as comorbidades. Agora, geneticistas europeus resolveram sequenciar o genoma de pacientes que tiveram um curso da doença mais grave. Um dos achados é surpreendente: pacientes com sangue do tipo A tiveram uma chance 50% maior de precisar de oxigênio ou demandar um respirador.
👍WEBINÁRIOS EM DESTAQUE:
✅INTERCOM - A Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação (Intercom) tem uma programação com lives semanais gratuitas. As lives Cátedra Intercom acontecem semanalmente, geralmente às terças e quintas, às 18h. Confira a programação dos próximos debates aqui.
✅Cobrindo manifestações: Quando jornalistas negros e pardos são o alvo - USC Annenberg/Center for Health Journalism. 👉NESTA QUARTA-FEIRA (10/6)☜, 14h30 (hora de Brasília) 📌Inscreva-se aqui📌
✅Cobrindo o coronavirus: Fome na infância e necessidades não-atendidas - USC Annenberg/Center for Health Journalism 📌Assista aqui na íntegra📌
✅Como cobrir a pandemia do Covid-19 no Brasil - Rede Covida 📌Assista aqui na íntegra📌
✅Impactos sociais da pandemia - Rede Covida 📌Assista aqui na íntegra📌
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